STF suspende resultado de julgamento com impacto bilionário para o varejo

Proclamação ocorrerá em sessão presencial após resultado apertado para que Estados deixem de cobrar ICMS na transferência de mercadorias em 2024

Joice Bacelo

O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a proclamação do resultado do julgamento sobre a cobrança de ICMS na transferência de mercadorias, de um Estado para outro, entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte. A discussão tem impacto bilionário para as empresas do varejo.

Esse julgamento foi concluído à meia-noite de quarta-feira no Plenário Virtual da Corte. Ficou definido, por um placar apertado de 6 a 5, que os Estados não poderão mais cobrar o imposto a partir do ano de 2024.

Os ministros definiram, ainda, que os Estados têm até o fim do ano para disciplinar o uso dos créditos acumulados. Se isso não acontecer, os contribuintes ficarão liberados para fazer as transferências sem ressalvas e limitações.

Ontem à noite, por volta de 22h, a Corte informou a suspensão do resultado. Consta, no sistema, que a proclamação ocorrerá em sessão presencial, sem data ainda definida.

A validação desse julgamento foi o assunto do dia entre advogados da área tributária. Há dúvidas entre os especialistas se o resultado gerado pelo placar de 6 a 5 será validado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Os ministros, nesse caso, estão modulando os efeitos de uma decisão proferida em abril de 2021 e existe regra na Corte determinando que para modular são necessários, pelo menos, oito votos.

O placar de 6 a 5 não atenderia esse quórum. Ocorre que todos os onze ministros entenderam pela necessidade de modulação. Há divergência, e por isso o placar apertado, somente na forma — a data de início da proibição da cobrança e a regulamentação da transferência de créditos.

Só haverá certeza se o quórum foi ou não atingido quando o STF publicar o resultado. A presidente do tribunal, ministra Rosa Weber, tem optado por enviar a proclamação de casos mais complicados para as sessões presenciais no Plenário da Corte. Fala-se, entre os ministros, em “resultado de consenso”.

Ontem, por exemplo, eles analisaram um caso idêntico a essse. Trata-se da ADI 4411, sobre uma lei de Minas Gerais que instituiu taxa por uso provável de serviço dos bombeiros. Os ministros decidiram contra essa taxa em julgamento virtual finalizado em abril de 2022.

Nove dos onze ministros entenderam pela necessidade de modulação. Só que seis deles optaram por um formato e três por outro. Por haver dúvida em relação ao quórum, a proclamação do resultado ficou suspensa.

Na sessão plenária de ontem, os ministros validaram a modulação de efeitos conforme definido pela maioria de seis votos. “Entendo que não há dúvida”, disse Weber, ao que o ministro Luiz Fux complementou: “Uma coisa é o quórum para modular. Nove ministros chegaram à conclusão que haveria modulação. Agora, a extensão da modulação foi acompanhada por seis ministros”.

A decisão por validar o julgamento dessa forma foi unânime. No caso de impacto para o varejo todos os onze ministros entenderam pela necessidade de modulação. Mas seis de um jeito e cinco de outro.

Em abril de 2021, os ministros decidiram que os Estados não poderiam cobrar ICMS na transferência de mercadorias, de um Estado para outro, entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte (ADC 49).

Essa decisão beneficiava o setor, mas tinha um efeito colateral grave: mexia nos créditos aos quais as empresas têm direito e usam para abater dos pagamentos do imposto.

O regime do ICMS é não cumulativo. Isso quer dizer que o que a empresa paga na etapa anterior, ao adquirir a mercadoria para revenda, serve como crédito para abater na etapa subsequente.

Com a decisão de abril de 2021, no entanto, o uso do crédito ficaria restrito ao Estado de saída da mercadoria. Isso geraria desequilíbrio no fluxo de caixa porque sobraria crédito num Estado e no outro a empresa seria obrigada a desembolsar, em dinheiro, todo pagamento.

Por isso, permaneceram as discussões. Esse “efeito colateral” foi tratado, agora, pelos ministros por meio de embargos de declaração. Eles precisavam definir a partir de quando a decisão que derrubou a cobrança de ICMS tem validade e como será a regulamentação do uso dos créditos.

Esse tema começou a ser julgado em outubro de 2021 — seis meses após a decisão que impediu os Estados de cobrarem ICMS — e foi sendo suspenso por uma sequência de pedidos de vista. Nessa semana, quando enfim foi concluído, era a quinta tentativa.

O entendimento do relator, ministro Edson Fachin, foi o que prevaleceu. A outra opção estava sendo capitaneada pelo ministro Dias Toffoli. Ele propôs que a decisão proibindo a cobrança do ICMS tivesse eficácia após o prazo de 18 meses contados da data de publicação da ata de julgamento dos embargos.

Para Toffoli, além disso, a regulamentação do regime de transferência dos créditos de ICMS deveria ficar a cargo de uma lei complementar.

O julgamento esteve empatado, em cinco a cinco, até por volta das 23h de quarta-feira, quando a ministra Rosa Weber depositou o seu voto no sistema — acompanhando o relator.

Um parecer da Tendências Consultoria Integrada anexado aos autos afirma que as dez maiores empresas do varejo do país corriam o risco de perder R$ 5,6 bilhões em créditos tributários por ano a depender da decisão da Corte.

Fonte: Valor Econômico, 13 de abril de 2023

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