Vinicius Medeiros
Desde a expansão e consolidação do setor de shopping centers no Brasil, a relação entre lojistas e administradores mudou sensivelmente. Se, no passado, o locatário costumava conhecer pessoalmente os proprietários dos centros de compras e negociava diretamente a renovação de contratos, entre outras pendências, hoje, o relacionamento é frio e profissional, gerando atritos que chegam a terminar na Justiça. Como oferecem grande fluxo de consumidores, os shoppings são um misto de sonho de consumo e pesadelo para os comerciantes, pois seus custos cada vez mais altos oferecem, em muitos casos, margens de lucro menores. Cautela e planejamento empresarial são essenciais para viabilizar a presença nesses pontos comerciais.
Para o advogado Mario Cerveira Filho, especialista em direito empresarial, a pujança do setor de shoppings levantamento da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop) aponta R$ 70,7 bilhões em vendas reais no ano passado mostra o estágio de profissionalização dos grandes grupos que atuam no País, como Aliansce, Ancar, BR Malls e Multiplan, entre outros.
“Os lojistas precisam acompanhar o movimento de profissionalização dos grandes grupos do setor. Devem saber perfeitamente seus direitos e deveres para ter poder de barganha durante negociações de contratos”, afirma.
Segundo Cerveira Filho, a Lei do Inquilinato, promulgada em 1991, tornou os contratos de locação atípicos, impondo novas obrigações aos inquilinos e mudanças na relação com os proprietários.
“As razões para essa atipicidade vão desde o aluguel percentual calculado sobre o faturamento e auditoria nos livros dos lojistas à contribuição para o fundo de promoção e à limitação do ramo de atividade, entre outras questões. Por conta dessas obrigações, o lojista precisa se cercar de cuidados já durante a assinatura do pré-contrato de locação. A mesma cautela deve existir na rescisão contratual, pois, além dos próprios locatários, há também fiadores envolvidos”, aconselha.
Luis Augusto Ildefonso, diretor de relações institucionais da Alshop, também recomenda cautela. “O empresário não pode abrir mão da ajuda de um advogado especializado. Não podemos negar que existe uma relação leão-cordeiro, em que os shoppings impõem as regras. Por isso, quanto mais o contrato for detalhado, melhor para o lojista, que terá pleno conhecimento de seus direitos, permitindo uma melhor negociação da renovação, por exemplo”, acredita.
Alto custo. Segundo Ildefonso, o preço dos aluguéis são as principais queixas dos lojistas. “O Brasil possui uma das maiores taxas de aluguel do mundo. Fora isso, elas crescem em níveis superiores à inflação, o que inviabiliza alguns negócios. É difícil, mas numa ação de renovação, o inquilino pode tentar impor no contrato a variação calculada sobre o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), menos oneroso do que o Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M)”.
Proprietário da marca U2, com lojas no BarraShopping e no Rio Sul dois dos mais tradicionais shoppings do Rio , o empresário carioca Ronaldo Scheimer revela que os altos custos de ocupação dos centros comerciais (aluguel, condomínio, IPTU, fundo de lojistas, entre outras obrigações) afetam pesadamente o faturamento.
“Manter um ponto de equilíbrio é realmente complicado. Hoje, os custos de ocupação representam cerca de 20% do faturamento. Com estas obrigações, operar o negócio em margens saudáveis é praticamente uma utopia”, revela.
Para o empresário Ricardo Beildeck, sócio-diretor da rede de lojas de moda feminina Mademoiselle e diretor de operações do Clube de Diretores Lojistas do Rio de Janeiro (CDL-Rio), há outras obrigações contratuais que também atrapalham bastante a vida dos lojistas.
“O 13º aluguel já virou prática comum, mas há shoppings que cobram também o 14º. Além disso, o chamado degrau (reajuste anual do contrato de aluguel) também é bastante oneroso, pois as vendas não acompanham proporcionalmente o crescimento. O lojista, obviamente, não repassa o aumento para o consumidor. Após dez anos, o contrato original praticamente dobra”, afirma.
Segundo Beildeck, se os empresários não se cercarem de cuidados, as exageradas obrigações contratuais pode levar a brigas na Justiça. “A consolidação do setor trouxe uma relação mais profissional entre lojistas e os grandes grupos de shoppings. Enquanto eles lucram assustadoramente, os empresários veem seus lucros se diluírem. É preciso haver mais equilíbrio, o que fatalmente reduzirá a intensa rotatividade nos pontos comerciais dos grandes centros comerciais. Com ajustes e acordos melhores para os dois lados, a tendência é que a relação, hoje conflituosa, torna-se mais amigável, como acontece no exterior”, afirma.
Apesar dos desequilíbrios, Beildeck afirma que ter lojas em shopping vale a pena. “Sem dúvidas, shoppings de grande movimento valem a pena. Se o empresário estiver bem assessorado, souber negociar bem e tiver boa visão empresarial, o retorno é muito bom. Além disso, se ele quiser expandir o negócio ou formar uma rede, inevitavelmente terá que estar nos centros comerciais”, acredita o empresário, que administra nove unidades no Rio, sendo quatro em shoppings Rio Sul, BarraShopping, NorteShopping e Shopping Tijuca.
Fonte: Jornal do Commercio Brasil, 4 de fevereiro de 2009