Por Daniel Cerveira
A antiga Lei de Franquias vigorou por mais de duas décadas com notável sucesso, na medida em que permitiu a ampla liberdade contratual, como é imprescindível neste mercado, sem ser omissa no que tange à necessidade de os franqueados adentrarem nos sistemas somente após receberem informações essenciais sobre o negócio escolhido, tais como, o investimento inicial, número de unidades existentes, entre outras. Também não se observou grandes controvérsias em torno do texto legal. O crescimento do franchising no Brasil demonstra esta dinâmica.
Nessa linha, a nova Lei de Franquias, que entrou em vigor em 2020, manteve a estrutura da anterior, especialmente no que se refere à obrigação da apresentação da circular de oferta de franquia aos candidatos com 10 dias de antecedência da “assinatura do contrato ou pré-contrato de franquia ou, ainda, do pagamento de qualquer tipo de taxa pelo franqueado ao franqueador ou a empresa ou a pessoa ligada a este, salvo no caso de licitação ou pré-qualificação promovida por órgão ou entidade pública”, com a vantagem de aliviar algumas discussões existentes, além de elevar a gama de dados a serem incluídos na circular de oferta e permitir que a franqueadora ingresse com a ação renovatória de contrato de locação, mesmo quando figurar como sublocadora total do ponto comercial onde se encontra instalada a unidade franqueada. Os novos elementos são positivos, tendo em vista que concedem maior transparência e segurança jurídica para as partes envolvidas, bem como incentivam o investimento no setor.
As principais modificações ocasionadas pela Lei 13.966/219 são as seguintes:
O artigo 1º atualizou a definição de franquia empresarial, sem grande relevância prática, em que pese ampliar as hipóteses para todos os objetos de propriedade intelectual. Ademais afasta expressamente a aplicação do Código de Defesa do Consumidor na relação entre a franqueadora e o franqueado e deixa expresso a inexistência de vínculo trabalhista entre os empregados do franqueado e a franqueadora, além de prever a possibilidade de empresas estatais e entidades sem fins lucrativos exercerem a condição de franqueadora.
Em comparação com a Lei 8.955/1994, o artigo 2º suprime algumas informações a serem inseridas na circular de oferta de franquia, acrescenta e altera outras, destacando a obrigação de ser comunicada a política de atuação territorial quanto à concorrência entre unidades próprias e franqueadas. Este item merece críticas. O conceito de “unidade própria” é subjetivo e o texto legal já determina que conste na circular de oferta a política acerca da exclusividade e preferência territorial da rede, conforme inciso “v” do artigo 2º.
No mais, a ampliação da abertura das informações são significativas com a nova Lei, quais sejam: (i) regras de transferência ou sucessão; (ii) situações em que são aplicadas penalidades, multas ou indenizações e dos respectivos valores, estabelecidos no contrato de franquia; (iii) cotas mínimas de compra pelo franqueado junto ao franqueador, ou a terceiros por este designados, e sobre a possibilidade e as condições para a recusa dos produtos ou serviços exigidos pelo franqueador; (iv) existência de conselho ou associação de franqueados, com as atribuições, os poderes e os mecanismos de representação perante o franqueador, e detalhamento das competências para gestão e fiscalização da aplicação dos recursos de fundos respectivos; (v) especificação precisa do prazo contratual e das condições de renovação, se houver; e (vi) local, dia e hora para recebimento da documentação proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, quando se tratar de órgão ou entidade pública.
O § 2º do 2º inovou dispondo que, na hipótese de falha na entrega da circular de oferta, o “franqueado” poderá arguir, além da anulabilidade que já era prevista na Lei 8.955/1994, a nulidade do contrato de franquia, conforme o caso, bem como exigir a devolução de todas e quaisquer quantias já pagas ao franqueador, ou a terceiros por estes indicados, a título de filiação ou de royalties, corrigidas monetariamente. Ponto de grande relevância para o franchising e que impactou com mais força alguns segmentos, cuida da nova configuração trazida pelo artigo 3º que permite que a franqueadora sublocadora do ponto comercial onde se encontra a unidade franqueada promova a chamada ação renovatória de contrato de locação prevista na Lei do Inquilinato.
Antes da nova Lei de Franquias somente a sublocadora parcial de imóvel tinha o direito de ajuizar a referida ação judicial. Desde que não implique em onerosidade excessiva, a franqueadora sublocadora, a partir de agora, poderá cobrar um valor de aluguel superior a quantia paga em virtude da locação originária, lembrando que a Lei do Inquilinato qualifica como contravenção penal o sublocador cobrar aluguel pela sublocação maior que o locativo do arrendamento primitivo. Esta disposição protege o interesse das franqueadoras que investem pesadamente nos pontos comerciais a serem ocupados pelos seus franqueados e, indiretamente, o setor como um todo.
Por fim, o artigo 7º estabelece regras específicas aos contratos de franquia internacionais e autoriza a utilização da arbitragem para a solução de conflitos, ambos temas alvos de discussões nos Tribunais.
Artigo publicado: Orbis News, 16 de fevereiro de 2023