A companhia deverá ainda pagar R$ 5 mil por danos individuais aos usuários diretamente atingidos pelo vazamento de dados
Flávia Maia
A 29ª Vara Cível de Belo Horizonte, Minas Gerais, condenou o Facebook a pagar R$ 20 milhões de indenização por dano moral coletivo por conta do vazamento de dados dos usuários entre 2018 e 2019 não só na própria rede social, mas também no Messenger e no WhatsApp, todos aplicativos pertencentes ao grupo empresarial. Além disso, a companhia deve pagar R$ 5 mil por danos individuais aos que foram diretamente atingidos pelo vazamento de dados. As decisões valem para usuários de todo o Brasil. Ainda cabe recurso.
A condenação se deu em duas ações civis públicas ajuizadas pelo Instituto Defesa Coletiva, entidade da sociedade civil. De acordo com a associação, em setembro de 2018, a rede social foi alvo de um ataque no qual hackers tiveram acesso às contas de cerca de 29 milhões de pessoas em todo o mundo – 15 milhões de pessoas tiveram dados como nome, número de telefone e e-mail vazados; outras 14 milhões tiveram ainda mais dados acessados, como gênero, localidade, idioma, status de relacionamento, religião, cidade natal, data de nascimento, dispositivos usados para acessar o Facebook, educação, trabalho e os últimos dez locais onde estiveram ou nos quais foram marcados.
Em 2019, um novo vazamento foi divulgado pela empresa de segurança virtual Up Guard e, dessa vez, o vazamento atingiu dados mais sensíveis, expondo senhas de 22 mil contas e detalhes da movimentação de mais de 540 milhões de usuários, sendo que não foi divulgado precisamente o número de brasileiros que tiveram seus dados, informações e perfis de comportamento utilizados de forma clandestina pelos hackers, devido à falha na segurança da prestação do serviço da requerida.
As sentenças assinadas pelo juiz José Maurício Cantarino Villela destacam que houve falha na prestação do serviço ao consumidor e, embora a empresa tenha sido atacada por hackers, a falha do sistema deve ser atribuída a quem tira fonte de lucro da atividade comercial, portanto, trata-se do risco da atividade.
“Neste sentido, entendo que as provas produzidas nos autos demonstram, de forma consistente, o defeito de prestação de serviço fornecido pelo réu, não havendo que se falar em imprevisibilidade/inevitabilidade, visto que o evento acima analisado configura fortuito interno inerente ao risco do empreendimento desenvolvido pela requerida”, escreveu o magistrado.
“Cumpre registrar que a ocorrência de tal episódio era previsível em se tratando deste tipo de atividade e, mesmo diante da qualidade e de mecanismos de segurança que o réu deve oferecer, tal constatação não afasta a conclusão de que o sistema é vulnerável. E a falha desse sistema deve ser atribuída a quem dele usufrui como fonte de lucro. É o chamado risco da atividade, não havendo que se falar em culpa exclusiva de terceiro”, complementou.
O magistrado ressalta ainda que o Facebook não nega que brasileiros foram atingidos pelos vazamentos de dados, embora não tenha informado a quantidade de perfis afetados no Brasil, “o que não obsta de se visualizar o potencial do dano, diante do elevado número de usuário do Facebook no Brasil, de forma que tal evento viola o direito de personalidade das pessoas/consumidores que utilizavam o serviço fornecido pela demandada”, justificou o magistrado.
Os R$ 20 milhões serão destinados ao Fundo Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (FEPDC/MG).
A advogada Instituto Defesa Coletiva, Lillian Salgado, explica que os consumidores que se sentirem lesados podem ingressar com ação para pedir a execução dos R$ 5 mil de indenização individual. Para ela, a sentença é uma grande vitória. “Ainda mais que está em vigor em nosso país a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que garante ao usuário a autodeterminação. Então é muito importante esse tipo de condenação para que as plataformas cumpram não só os direitos dos consumidores, mas o que está previsto na LGPD”, diz.
A Meta, empresa responsável pelo Facebook, WhatsApp e Messenger, informou que a companhia não foi notificada da decisão.
Processos citados na matéria: ACP 5064103-55.2019.8.13.0024 e ACP 5127283-45.2019.8.13.0024.
Fonte: Jota, 26 de julho de 2023