Por Adriana Aguiar
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou a analisar a tese sobre a exclusão de valores descontados de empregados para uso de vale-transporte, vale-alimentação e plano de saúde com coparticipação do cálculo da contribuição previdenciária patronal. Não há, porém, decisão totalmente favorável aos contribuintes.
A tese, segundo advogados, é uma das mais importantes da área previdenciária para as empresas. Surgiu após a elaboração de pareceres por grandes escritórios e ganhou mais força na pandemia, como uma forma de reforçar o caixa.
Os contribuintes alegam nos processos que deve entrar no cálculo da contribuição previdenciária apenas o que for destinado a retribuir o trabalho, como prevê o artigo 195, inciso I, alínea a, da Constituição e o artigo 22, inciso I, da Lei nº 8.212, de 1991. O que não seria o caso dos valores descontados dos funcionários referentes a vale-transporte, alimentação e plano de saúde.
Para a Receita Federal, porém, esses valores fizeram parte da remuneração do trabalhador e não podem ser excluídos da base da contribuição patronal, que é a folha de pagamentos – com alíquota de 20%. O entendimento está na Solução de Consulta nº 96, da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), que desde junho orienta os fiscais do país.
As decisões apontadas pelo levantamento são monocráticas, ou seja, de autoria de um só ministro. Todos os processos julgados são do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, no Sul do país, que tem consolidado seu entendimento a favor da Fazenda Nacional.
Em geral, no STJ, os contribuintes têm conseguido, com mais facilidade, excluir do cálculo o desconto do vale-transporte. Há decisões dos ministros Assusete Magalhães (REsp 1948867), Sérgio Kukina (REsp 1936980), Benedito Gonçalves (REsp 1920711) e Gurgel de Faria (REsp 1894150).
Apenas o ministro Og Fernandes foi um pouco além, de acordo com o levantamento, e aceitou a exclusão também dos valores de alimentação, desde que seja in natura ou cesta básica (REsp 1939757). Já os ministros Herman Benjamin (REsp 1952036) e Mauro Campbell (Agravo em REsp 1881412) têm negado todos os pedidos dos contribuintes.
A decisão do ministro Og Fernandes favorece a Copobras Indústria e Comércio de Embalagens. A empresa recorreu ao STJ após decisão desfavorável da 2ª Turma do TRF da 4ª Região.
Og Fernandes destaca na decisão que “a jurisprudência desta Corte Superior segue no sentido da não incidência de contribuição previdenciária sob as rubricas vale-transporte e auxílio-alimentação, devido à natureza indenizatória, mesmo na sistemática do custeio compartilhado (entre empregador e empregado, por meio de descontos)”. Ele cita entendimento semelhante, de junho, em processo de relatoria do ministro Herman Benjamin (REsp 1940120).
Porém, em seguida faz a ressalva de que em relação ao auxílio-alimentação, pago em espécie ou em pecúnia, com habitualidade, “consolidou-se na Seção de Direito Público desta Corte Superior o entendimento de que incide contribuição previdenciária”.
Os advogados que assessoram a empresa, Luiza Ludvig de Sousa, Alfredo Rodriguez e Gabriel Sousa, ressaltam que o entendimento do ministro contra a tributação vale para alimentos in natura ou cesta básica. Caso contrário, acrescentam, não faria sentido a ressalva feita por Og Fernandes.
Como a decisão não tratou dos descontos sobre planos de saúde, Alfredo Rodriguez afirma que já pediram esclarecimentos nos embargos de declaração apresentados. Para ele, sobre esse ponto, a Lei nº 8.212, de 1999, é ainda mais clara sobre a possibilidade de exclusão – parágrafo 9º do artigo 28. “Vários clientes nossos já conseguiram decisões transitadas em julgado e como a lei é clara nem todos pedem”, diz.
O advogado Alessandro Mendes Cardoso, afirma que chama a atenção o fato de os ministros analisarem esse tema monocraticamente, já que não é um assunto consolidado no STJ. “O que já está pacificado é a natureza das verbas, mas não sobre a natureza dos descontos”, diz.
O STJ, acrescenta, não avaliou que vale-transporte, alimentação e plano de saúde podem ser classificados como um benefício social, o que justifica, inclusive, a não inclusão no salário de contribuição pela Lei nº 8.212/91 – a parcela custeada diretamente pelo empregador.
O advogado Gustavo Mitne, que tem diversos processos sobre o tema, afirma que essas primeiras ações são anteriores ao movimento dos grandes escritórios. Os processos mais recentes, diz, que ainda não chegaram ao STJ, estão mais fundamentados. “As decisões futuras devem trilhar um caminho melhor. As turmas poderão aprofundar o debate.”
Em nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informa que o Supremo Tribunal Federal já definiu o alcance da expressão “folha de salários”, com a tese de repercussão geral de que “a contribuição social a cargo do empregador incide sobre ganhos habituais do empregado, a qualquer título” (RE 565160). Assim, acrescenta, “os valores descontados a título de vale-transporte, auxílio-alimentação, plano de saúde e previdência complementar fazem parte do salário e, portanto, do total da remuneração do trabalhador, pois se destinam a retribuir os serviços prestados”.
Fonte: Valor Econômico: 15 de setembro de 2021