Direito de preferência na aquisição de imóvel em Shopping Center

Na hipótese de o empreendedor não oferecer o imóvel ao lojista no curso da locação (por prazo determinado ou indeterminado), este poderá reclamar do primeiro as perdas e danos correspondentes, ou se desejar, depositar o preço em juízo e demais despesas do ato de transferência, objetivando a sua aquisição (artigo 33 da Lei nº 8.245).

O prazo de o lojista pleitear esses direitos não poderá ultrapassar seis meses, contados do registro da venda no Cartório de Registro de Imóveis, desde que o contrato de locação esteja averbado nesse cartório, junto a sua matrícula, pelo menos 30 (trinta) dias antes da alienação. Os termos do parágrafo único desse artigo completam: “A averbação far-se-á à vista de qualquer das vias do contrato de locação, desde que subscrito também por duas testemunhas”.

Como preceitua o eminente processualista Theotonio Negrão, “nada impede que a ação seja proposta antes do registro, pois, do contrário, o adquirente de má-fé poderia, não efetivando o registro, retardar indefinidamente a possibilidade de propositura de ação pelo locatário. O prazo de seis meses é o termo final para a propositura da ação, mas o registro não é o termo inicial do prazo”.

Em meu entendimento, após profundo estudo jurisprudencial, o lojista poderá requerer perdas e danos, independentemente do registro do contrato de locação no Cartório do Registro de Imóveis, uma vez que seu direito é de natureza pessoal e o legitima a reclamá-lo. Não há dúvida de que na hipótese de o lojista desejar adquirir o imóvel a ele locado, deverá ter o seu contrato de locação registrado junto a sua matrícula, uma vez que neste caso, o seu direito é de natureza real.

Os danos que o locatário poderá pleitear em juízo são os danos emergentes e lucros cessantes.
Se o adquirente despeja o inquilino, todas as despesas relativas à mudança seriam exemplo de dano emergente. Por outro lado, a diferença entre o preço pelo qual foi vendido o imóvel e seu real valor, seja porque o valor consignado não refletia a realidade da transação, seja porque o imóvel teria sofrido valorização, o que representaria aquilo que o locatário deixou razoavelmente de lucrar (lucros cessantes).

Alguns acórdãos, entretanto, somente deferem o pleito de perdas e danos, desde que haja os requisitos abaixo transcritos:

Locação. Direito de preferência (artigo 33 da Lei nº 8.245/1991). Perdas e danos. Demonstração da capacidade e prejuízos econômicos. Necessidade.

Da dicção do artigo 33 da Lei nº 8.245/1991, colhe-se que, além dos requisitos ali previstos, pode o locatário pleitear perdas e danos se preterido no seu direito de preferência, sempre mediante demonstração incontroversa que efetivamente reúne condições econômicas para realizar a transação e que suportou prejuízos concretos com ausência de tempestiva oportunidade. (Ap. s/ Rev. nº 393.162-9, 9ª Câm. Rel. Juiz Francisco Antonio Casconi, j. 11.5.1994).

Essa é uma ação pessoal que pode ser movida pelo locatário e deve ser dirigida apenas contra o vendedor. O comprador é parte ilegítima para figurar como réu, pois a ele não se pode imputar a prática de qualquer infração ao direito do locatário de ser consultado sobre seu direito de preferência.

Além da ação de indenização, o locatário preterido poderá mover demanda para haver para si o imóvel vendido a terceiro. Será ação real, fazendo presente na espécie a regra do artigo 10 do Código de Processo Civil: o autor necessita do consentimento do seu cônjuge, e deverão figurar como réus o vendedor e o comprador, bem como seus respectivos cônjuges.

Cumpre salientar que o empreendedor só poderá alienar o imóvel a terceiro interessado, nas mesmas condições e preço oferecidos ao lojista, sendo certo que se forem desobedecidas tais condições, o lojista poderá requerer tanto as perdas e danos correspondentes ou requerer a adjudicação do bem, depositando o valor do preço nas mesmas bases do contrato de venda.
Nesse sentido, a inteligência do v. acórdão abaixo transcrito:

“Venda de imóvel locado. Prelação. Decadência. Contrato não registrado no Cartório de Registro de Imóveis. Depósito do preço. Inexistência. Conseqüências”.

Decai do direito de prelação o locatário que aceita a oferta do locador, mas impõe condições diferentes das que lhe foram oferecidas. Se o contrato de locação não foi registrado, no Registro Geral de Imóveis, pelo menos 30 dias antes da alienação, o locatário, preterido no seu direito de preferência pode exigir do alienante perdas e danos, mas não lhe assiste o direito de reivindicar para si o imóvel, pagando o preço pelo qual foi alienado. Desse direito de reivindicação decai o locatário que, no prazo de seis meses, contados a partir do registro do ato, no Registro de Imóveis, não deposita o preço da alienação e o valor das despesas de transferência. (AC nº 14.439/02, 8ª Câm. Rel. Juiz Wilson Marques, j.11.11.1992)”.

Os requisitos para a concessão do direito de preferência foram estampados em significativo acórdão, in verbis:

“Para assegurar o direito de preferência à aquisição do imóvel locado, que a lei lhe confere, o locatário, além de dar resposta positiva à proposta, precisa apresentar ao locador, dentro do prazo de trinta dias, oferta real, indicando, desde logo, dia, hora e cartório de notas, para assinatura da escritura, nas condições oferecidas.

Não pode haver para si, o imóvel alienado, com violação do direito de preferência, o locatário que, pelo menos trinta dias antes da alienação, não registrou o contrato de locação, no cartório do registro imobiliário, e no prazo de seis meses contados do registro da escritura, não depositou com moeda atualizada, o preço e demais despesas do ato da transferência.

Se não faz prova de que dispunha de capacidade econômica para adquirir o imóvel locado e de que sofre prejuízo porque não o adquiriu, o locatário não tem direito de exigir do locador o pagamento de perdas e danos resultante da violação do seu direito de preferência. (Ac. nº 5.328/1994, 8ª Câm. Rel. Juiz Wilson Marques, j.17.8.2004)”.

Atualmente, muitos empreendedores de shopping centers, com o objetivo de burlar a lei e induzindo os lojistas a erro, têm consignado cláusula onde estes últimos renunciam, expressa e antecipadamente, de eventual direito de preferência, no próprio ato da assinatura do contrato de locação.

Ora, esta cláusula é nula de pleno direito, conforme preceitua o artigo 45 da Lei nº 8.245/1991, uma vez que traduz, na verdade, evidente propósito de elidir os objetivos da Lei Inquilinária. O direito de preferência deverá ser contemporâneo à alienação do bem.

MARIO CERVEIRA FILHO é advogado especializado em Direito Civil e Comercial, co-titular do escritório de Advocacia Cerveira Advogados Associados, autor do livro Shopping Centers: Direitos dos Lojistas, Ed. Saraiva, 2ª edição, e do Projeto de Lei nº 7.137/2002, que visa equilibrar a relação contratual locatícia, pertinente aos Shopping Centers, apresentado em Brasília em 27.8.2002, pela Deputada Federal, Dra. Zulaiê Cobra

Artigo publicado: Revista Justilex, 11 de novembro de 2004

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