Da purgação da mora na Ação de Despejo

Mario Cerveira F. e Daniel A. N. Cerveira*

Como é notório, o maior problema enfrentado pelos aplicadores do direito no Brasil é a morosidade do Poder Judiciário, que comprovadamente acarreta sérios danos de toda ordem para a sociedade.

Assim, as medidas liminares devem ser intensamente exploradas pelos advogados, cumprindo esclarecer, de plano, que não se pretende com o presente, incentivar o uso arbitrário das liminares, mas ao contrário, chamar a atenção para as ferramentas disponíveis para resguardar direitos e evitar danos irreparáveis.

Com efeito, questão razoavelmente controvertida, diz respeito ao cabimento de liminar em ação de despejo, além dos casos previstos na Lei Inquilinária (vide artigo 59, § 1º), visando o desalijo independentemente da audiência do inquilino.

Nessa esteira, acredito ser possível o pedido de tutela antecipada em ação de despejo para o desalijo liminar do locatário (e não a medida cautelar elencada nos artigos 796 e ss, do Código de Processo Civil, pois esta tem a finalidade de garantir o resultado útil do processo e a tutela antecipada serve para adiantar, no todo ou em parte, os efeitos pretendidos com a sentença de mérito a ser proferida ao final – RSTJ 106/169), uma vez que a Lei 8.245/91 não afastou a incidência do Código de Processo Civil, pelo contrário, o artigo 79 estabelece que devem ser aplicadas as normas do referido Codex no que for omissa.

Além do mais, a Lei do Inquilinato, efetivamente, recepcionou o novo regime previsto no artigo 273, do Código de Processo Civil, bem como é evidente que esta disposição legal não afronta os seus objetivos.

Ademais, seria incoerente admitir apenas a antecipação da tutela para os casos previstos no parágrafo primeiro, do artigo 59, da Lei do Inquilinato, e não nas hipóteses em que estiverem preenchidos os requisitos do artigo 273, do Código de Processo Civil.

Sob tal ótica, desde que preenchidos os requisitos do artigo 273, do Código de Processo Civil, tem-se como possível o pedido de tutela antecipada em ação de despejo. Os pressupostos são: (i) prova inequívoca e verossimilhança; (ii) periculum in mora; e (iii) reversibilidade.

Assim já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

“AÇÃO DE DESPEJO. TUTELA ANTECIPADA. POSSIBILIDADE.
Cabível, nas ações de despejo, a antecipação de tutela, como o é em toda a ação de conhecimento, seja a ação declaratória, seja constitutiva (negativa ou positiva) condenatória, mandamental, se presentes os pressupostos legais. Recurso não conhecido”.
(Superior Tribunal de Justiça, ACÓRDÃO: RESP 445863/SP (200200800960), 468299 RECURSO ESPECIAL, DATA DA DECISÃO: 05/12/2002, ORGÃO JULGADOR: – QUINTA TURMA)

Como aludido, a questão é controvertida, conforme a ementa abaixo do Tribunal de Justiça de São Paulo, na qual ficou decidido que não é possível o pedido de liminar em ação de despejo, sob o fundamento de que o rol do artigo 59, § 1º, da Lei do Inquilinato é taxativo, in verbis:

“DESPEJO – FALTA DE PAGAMENTO – LIMINAR – FUNDAMENTAÇÃO NO ARTIGO 59, § 1º DA LEI 8.245/91 – DESCABIMENTO
Despejo por falta de pagamento. Liminar para desocupação do imóvel sem audiência da parte contrária. Descabimento. Dicção do artigo 59, § 1º da Lei 8.245/91, que ostenta rol taxativo das hipóteses que comportam a concessão de liminar. Faculdade de purga da mora que obsta, de todo modo, o decreto imediato da desocupação”.
(TJ/SP – AI 886.997-00/8 – 28ª Câm. – Rel. Des. CESAR LACERDA – J. 8.3.2005)

O grande jurista e especialista no assunto, Sylvio Capanema de Souza, in “Da locação do Imóvel Urbano – Direito e Processo”, Editora Forense, às páginas 417 e 419, posiciona-se, no sentido do cabimento da antecipação da tutela em ação de despejo, inclusive enfrentando o tema ligado à reversibilidade, in verbis:

“Corrente contrária, e não menos respeitável, na qual nos abrigamos, com a mais arraigada convicção, sustenta ser possível a antecipação da tutela de mérito, nas ações locativas, fora das hipóteses referidas na Lei nº 8.245/91, desde que presentes os pressupostos do art. 273 do Código de Processo Civil”
(…)
“A alegação de irreversibilidade do provimento não deve servir de óbice intransponível à sua aplicação.

Julgada improcedente a pretensão, será o autor condenado a reparar integralmente os danos causados ao réu, pela indevida antecipação.

Aliás, a se admitir que a medida não possa ser concedida, em razão da sua irreversibilidade, também não se poderia tolerar as liminares previstas no art. 59, parágrafo único, ou a execução provisória das sentenças de despejo”.
(negritos nossos)

*Os autores são sócios do escritório Cerveira Advogados Associados.

Artigo publicado: Diário das Leis Imobiliário, 19 de dezembro de 2006

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