Mario Cerveira Filho*
A Lei 8.245/91, conhecida como Lei do Inquilinato, dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos, ou seja, estipula as principais regras para as locações de bens imóveis, sejam eles destinados ao comércio ou a moradia. Muito embora a Lei do Inquilinato possua disposições que protegem os locadores, existem outras que atendem aos interesses dos locatários, como a purgação (pedido de pagamento) da mora (dívida em atraso) em ação de despejo por falta de pagamento.
O artigo 62, inciso II, da Lei 8.245/91, cuida da purgação da mora e estabelece que na ação de despejo por falta de pagamento, o locatário poderá, no prazo da contestação (que é de 15 dias), pleitear a purgação da mora do débito locatício, cujo objetivo é evitar o despejo. Ou seja, purgada corretamente a mora, a ação de despejo é julgada extinta e o contrato de locação segue normalmente.
Um detalhe relevante diz respeito ao parágrafo único, do artigo 62, que estabelece “não se admitirá a emenda da mora se o locatário já houver utilizado essa faculdade por duas vezes nos doze meses imediatamente anteriores à propositura da ação”.
“Purgada corretamente a mora, a ação de despejo é julgada extinta e o contrato de locação segue normalmente. ”
Contudo, a notória lentidão do Poder Judiciário, especialmente o paulista, torna muitas vezes inócuo o dispositivo, pois não é raro que todo o procedimento em pauta leve mais de um ano.
Outra situação que não poderia deixar de ser mencionada, trata da possibilidade da purgação parcial da mora, que ocorre quando o locatário concorda com parte da cobrança e não com o restante. Neste sentido, o locatário poderá pagar a parte incontestável e apresentar a sua defesa para a quota que entende ser inexigível.
Como é intuitivo, salvo a questão que envolve os reajustes dos valores de locação – o que pode gerar controvérsias –, dificilmente o não pagamento do aluguel será discutível na medida em que se configura como um valor certo. Por outro lado, isto não ocorre com os encargos da locação, principalmente os inerentes aos shoppings (condomínio e encargos comuns, fundo de promoção, seguros, taxas de administração, encargos específicos etc.), pois são excessivamente complexos e nem sempre os locadores autorizam o acesso aos documentos que os justificam.
Igualmente oportuna para o tema em exame é a interpretação do disposto no parágrafo 2º, do artigo 23, da Lei 8.245/91, que regulamenta o dever do locatário de pagar encargos condominiais ou comuns: “O locatário fica obrigado ao pagamento das despesas referidas no parágrafo anterior, desde que comprovada a previsão orçamentária e no rateio mensal, podendo exigir a qualquer tempo a comprovação das mesmas”.
Sob tal ótica, o locatário só ficará obrigado no pagamento, quando o locador comprovar que o valor está correto. Ou seja, o inquilino só está obrigado a pagar o aluguel e os encargos legais ou contratualmente exigíveis. Por último, cabe esclarecer, que o locatário só poderá deixar de proceder ao pagamento dos encargos quando efetivamente o locador não exibe os documentos solicitados. Nesse caso, a recusa do pagamento deve ser robustamente fundamentada e precedida de comunicação por escrito ao locador. Aconselha-se consultar um advogado antes de recusar-se ao pagamento em virtude do alto grau de complexidade jurídica envolvida e uma vez que só a análise do caso concreto poderá indicar que procedimento deve ser acolhido pelo locatário.
*Autor é advogado e consultor da Alshop.
Colaboração: Daniel Alcântara Nastri Cerveira.
Artigo publicado: Revista Alshop, 29 de novembro de 2006