Por Francisco dos Santos Dias Bloch*
A Lei 13.966/2019, a nova Lei de Franquias, visa regulamentar a relação entre franqueados e franqueadores no sistema jurídico brasileiro, revogando a anterior Lei 8.955/1994.
Entre outros assuntos, o texto regulamenta a sublocação de um imóvel comercial entre o franqueador, na qualidade de sublocador, e o franqueado, na qualidade de sublocatário. Tais disposições representam um progresso nas relações de franchising, mas devem ser interpretadas em conjunto com a Lei do Inquilinato para estabelecer quais foram as reais mudanças ocorridas nas relações entre o franqueado, o franqueador, e o locador principal do imóvel alugado.
Vejam-se a seguir as principais mudanças trazidas pela Lei 13.966/2019, assim como alguns breves comentários sobre cada ponto:
“Art. 3.º Nos casos em que o franqueador subloque ao franqueado o ponto comercial onde se acha instalada a franquia, qualquer uma das partes terá legitimidade para propor a renovação do contrato de locação do imóvel, vedada a exclusão de qualquer uma delas do contrato de locação e de sublocação por ocasião da sua renovação ou prorrogação, salvo nos casos de inadimplência dos respectivos contratos ou do contrato de franquia.”
O primeiro fator a se considerar é que as sublocações devem ser sempre autorizadas pelo locador principal. Entendemos que a nova Lei de Franquias não criou uma exceção a esta regra, prevista no artigo 13 da Lei do Inquilinato (“A cessão da locação, a sublocação e o empréstimo do imóvel, total ou parcialmente, dependem do consentimento prévio e escrito do locador”).
A sublocação do imóvel, mesmo do franqueador ao franqueado, ainda exige autorização prévia e por escrito do locador principal. Sem esta autorização a cessão do imóvel implicará em infração contratual e o franqueado, na condição de sublocatário irregular, naturalmente não terá direito à demanda renovatória de locação.
De todo modo, atendidas as condições legais tanto o franqueador (sublocador) quando o franqueado (sublocatário) poderão ingressar com a ação renovatória de locação comercial, mesmo que o franqueado tenha recebido a posse integral do imóvel alugado.
Esta é uma exceção à norma prevista no parágrafo primeiro do artigo 51 da Lei do Inquilinato, segundo a qual, na hipótese de sublocação integral do imóvel, apenas o sublocatário poderá mover a ação renovatória (“(…) no caso de sublocação total do imóvel, o direito à renovação somente poderá ser exercido pelo sublocatário”).
Nesta situação, portanto, tanto o franqueador quanto o franqueado poderão mover a ação renovatória de locação comercial contra o locador, de maneira a prorrogar a vigência do contrato de locação principal.
Ou seja, o franqueado poderá indiretamente assegurar a viabilidade de seu próprio contrato de sublocação. Afinal, caso se encerre o prazo do contrato de locação principal sem que haja o manejo da ação renovatória, o locador poderá despejar o seu inquilino e, indiretamente, poderá também rescindir todas as sublocações referentes ao imóvel, nos termos do artigo 15 da Lei 8.245/91 (“Rescindida ou finda a locação, qualquer que seja sua causa, resolvem-se as sublocações, assegurado o direito de indenização do sublocatário contra o sublocador”).
Sob este ponto de vista, portanto, a nova lei trouxe maior segurança jurídica ao franqueado, que poderá assegurar sua permanência no imóvel mesmo se o franqueador deixar de mover a ação renovatória do contrato principal.
Por outro lado, e considerando o ponto de vista do franqueador, as mudanças também são positivas. Caso haja a sublocação integral do imóvel ao franqueado este poderá mover diretamente a ação de renovação, assegurando a preservação do ponto comercial, mesmo se o franqueado não mover a ação judicial.
“Art. 3º (…)
Parágrafo único. O valor do aluguel a ser pago pelo franqueado ao franqueador, nas sublocações de que trata o caput, poderá ser superior ao valor que o franqueador paga ao proprietário do imóvel na locação originária do ponto comercial, desde que:
I – essa possibilidade esteja expressa e clara na Circular de Oferta de Franquia e no contrato; e II – o valor pago a maior ao franqueador na sublocação não implique excessiva onerosidade ao franqueado, garantida a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro da sublocação na vigência do contrato de franquia.”
A Lei do Inquilinato proíbe expressamente a cobrança de aluguel, nas sublocações, em quantia superior ao valor pago ao locador principal, inclusive sob pena de contravenção penal (artigo 43, inciso II). A norma acima é uma exceção à regra e permite ao franqueador que, atendidas as condições previstas na Lei de Franquias, cobre valores superiores de seu franqueado a título de aluguel, desde que estes não impliquem em “excessiva onerosidade”.
O conceito de “excessiva onerosidade”, em termos práticos, pode significar apenas um valor adicional sobre o valor de mercado do imóvel alugado, cabendo à jurisprudência estabelecer um percentual que, em cada caso, seja ou não considerado excessivo. Mas há um ponto relevante no que diz respeito a este assunto.
É bastante comum que as franqueadoras aluguem um imóvel, paguem despesas relevantes a título de reforma, atuem diretamente na exploração da atividade comercial e, posteriormente, tenham interesse em arrendar o fundo de comércio como um todo para um franqueado, preservando a marca de sua rede no local.
A Lei do Inquilinato prevê expressamente a possibilidade de locação de imóvel que envolva, igualmente, o fundo de comercio, com suas instalações e pertences (artigo 52, parágrafo primeiro). Entendemos que nestas hipóteses o valor do aluguel pode ser substancialmente maior do que o simples valor de mercado do locativo, uma vez que o arrendamento envolve outros bens, materiais e imateriais, que não apenas a posse do imóvel sublocado; o franqueado, na qualidade de sublocatário, frequentemente receberá um espaço adequado para suas atividades e com clientela constituída, sendo razoável que pague por estes privilégios, entre outras vantagens inerentes ao espaço comercial alugado.
De maneira geral, e considerando as observações acima, entendemos que a nova Lei de Franquias trouxe mudanças positivas, uma vez que implica em maior flexibilidade e segurança jurídica nas relações entre franqueados e franqueadores, no que diz respeito à preservação e à cessão do espaço comercial alugado para o desenvolvimento da atividade empresarial franqueada.
*Francisco dos Santos Dias Bloch, mestre e pós-graduado em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), advogado e sócio do escritório Cerveira, Bloch, Goettems, Hansen e Longo Advogados Associados (www.cerveiraadvogados.com.br), nas áreas de Direito Contencioso Cível e Direito Imobiliário.
Artigo publicado: Blog Fausto Macedo – Estadão, 27 de janeiro de 2020