Empresas recorreram à Justiça para manter o benefício até, pelo menos, o fim de 2018
Beatriz Olivon e Joice Bacelo
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) validou, ontem, a exclusão de 11 setores da economia do regime de desoneração da folha de pagamentos. Empresas de hotelaria, navegação, transporte aéreo e marítimo, além de algumas do varejo, estão entre as afetadas por essa decisão.
As companhias foram excluídas do regime pela Lei nº 13.670, de maio de 2018, e recorreram à Justiça para tentar manter o benefício até, pelo menos, o fim daquele ano.
Essa norma reduziu de 28 para 17 o número de setores que podiam optar por contribuir para a previdência por meio do regime da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB) .
Foi a saída encontrada, na época, para amenizar as perdas que a União teria com a redução dos tributos do óleo diesel — que, dentre outras medidas, acabaria com a greve dos caminhoneiros que paralisava o país.
As empresas recolhiam para a Previdência entre 2,5% e 4,5% sobre a receita bruta e, por força da nova lei, passaram a ser obrigadas à tributação “convencional”, de 20% sobre a folha de salários.
Começou ali, no entanto, uma enorme discussão sobre a data da mudança de regime. A Lei nº 13.670 deu prazo de 90 dias para que os setores excluídos se organizassem e começassem a fazer os pagamentos no novo formato. A publicação ocorreu em maio e a mudança de regime seria em setembro.
As empresas não concordaram e recorreram ao Judiciário. Argumentavam que haviam feito uma opção irretratável no começo do ano e, por esse motivo, deveriam ter o direito de permanecer no regime da CPRB pelo menos até o fim do exercício de 2018.
Coube ao STJ, agora, dar a palavra final sobre a data correta. Os ministros da 1ª Seção se posicionaram, de forma unânime, contra as empresas. O julgamento foi realizado ontem em caráter repetitivo, ou seja, com efeito vinculante para todo o Judiciário.
O ministro Herman Benjamin, relator do tema, leu apenas as teses que foram fixadas. São duas. Uma diz que “a regra da irretratabilidade da opção da contribuição previdenciária sobre receita bruta prevista no parágrafo 13 do artigo 9 da Lei nº 12.546, de 2011, destina-se apenas ao beneficiário do regime e não à administração”.
Já a outra tese aprovada pelo STJ estabelece que “a revogação da escolha de tributação da contribuição previdenciária pelo sistema da CPRB trazida pela Lei nº 13.370, de 2018, não feriu direitos do contribuinte uma vez que foi respeitada a anterioridade nonagesimal” (REsp 1901638 e REsp 1902610).
Advogados de empresas estavam pessimistas com o resultado desse julgamento. As duas turmas que tratam das questões de direito público no STJ — 1ª e 2ª — tinham decisões contra o contribuinte, ou seja, permitindo a mudança de regime conforme o que foi determinado na lei.
A 1ª Seção, onde ocorreu o julgamento em repetitivo, reúne os ministros das duas turmas. Era pouco provável, portanto, que houvesse uma virada de posicionamento.
Especialistas destacam que a decisão de ontem pode ter sido o fim da linha para esse tema. Essa discussão chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) e os ministros afirmaram se tratar de questão infraconstitucional. Sendo assim, a palavra final fica mesmo com o STJ.
Afirmam, além disso, que o desfecho tem consequências para o caixa das companhias. Como ficou definido que vale setembro de 2018, as empresas que não cumpriram a regra — e continuaram recolhendo pela CPRB até o fim daquele ano — poderão ser cobradas pelo governo e, nesse caso, terão que fazer a complementação de tributos.
“A maioria das decisões de primeira instância sobre o tema foram favoráveis aos contribuintes em 2018 e muitas dessas decisões favoráveis foram mantidas até agora”, diz Guilherme Yamahaki, sócio do escritório Schneider Pugliese.
Com a decisão em repetitivo do STJ, no entanto, ele frisa, essas decisões favoráveis serão revogadas e as empresas terão que apurar os valores devidos entre a CPRB e a contribuição sobre a folha.
Também especialista em tributação, Rodrigo Antônio Dias, sócio do escritório VBD Advogados, frisa que a advocacia sabe que não existe garantia de regime tributário eterno para ninguém e que não brigou contra a mudança na legislação.
O problema, aqui, ele diz, foi o fato de a alteração de regime ter sido feita no meio do ano. “As regras do jogo mudaram enquanto o jogo estava sendo jogado. Decisões empresariais foram tomadas com base na expectativa de que a tributação seria daquela forma durante todo aquele ano”, frisa.
Para o advogado, decisão da Justiça aceitando essa mudança contraria a preservação da segurança jurídica e aumenta o risco Brasil.
Especialistas afirmam que a desoneração da folha é importante para garantir a manutenção de empregos de setores que são intensivos em mão de obra.
Há discussão no Congresso sobre a prorrogação do prazo para as empresas de 17 setores que ainda têm direito ao benefício. Terminaria em 31 de dezembro e o projeto aprovado terça-feira pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado estende até o fim de 2027.
Fonte: Valor Econômico, 14 de junho de 2023