Direitos e deveres dos lojistas e as reclamações dos consumidores

Érica de Lima Siqueira*

Faltando pouco menos de um mês para o Natal, muitos consumidores já iniciaram as compras e os órgãos de defesa do consumidor iniciaram as autuações decorrentes do não cumprimento, pelos comerciantes, da legislação consumerista.

Nesse período, rotineiramente, o Procon intensifica a fiscalização e os alertas aos consumidores sobre práticas ilegais e abusivas implementadas, ainda que por descuido, pelos comerciantes. Ação que faz com que muitos lojistas iniciem o ano com problemas para resolver.

No âmbito do direito do consumidor, a única forma do lojista inibir autuações dos órgãos de proteção ao direito do consumidor, e se blindar contra as ações movidas pelos consumidores, é o cumprimento rigoroso das leis consumeristas.

Este texto visa, de maneira objetiva, esclarecer as mais comuns dúvidas dos lojistas, para que assim também sejam evitadas reclamações dos consumidores:

Sou obrigado a aceitar o pagamento das compras por cheque ou cartão de crédito?

Não. De acordo com o artigo 315 do Código Civil, o único meio de pagamento de aceitação obrigatória em nosso país é a moeda corrente nacional (real), o que significa que as demais formas de pagamento não são de aceitação obrigatória pelo comerciante.

No entanto, se o lojista decidir não aceitar outros meios de pagamento, é necessário que exista a informação ostensiva para o consumidor (com cartazes visíveis dentro, e se possível fora, do estabelecimento).

Além disso, é ilegal a prática de aceitar somente cheques da praça, ou de determinados bancos, ou mesmo de correntistas que tenham contas especiais. Isso porque a forma de pagamento deve ser aplicada de forma indistinta (a regra deve ser aplicada a todos os consumidores, sem exceção). Se optar pela aceitação de cheques, o lojista estará assumindo o risco da sua atividade, ou seja, eventuais prejuízos decorrentes de cheques sem fundos, sem discriminar ou submeter a vexame os demais consumidores.

Posso fazer diferenciação de preço para pagamento em dinheiro ou no cartão quando der desconto em algum produto?

Não. Isso porque não pode haver distinção de valor para um mesmo produto. Logo, se o lojista aceitar a opção de pagamento no cartão, não é possível conceder o desconto na peça apenas quando pago à vista.

Posso estipular um limite mínimo para compras realizadas no cartão de crédito ou débito?

Não. Desde que aceitos como forma de pagamento o cartão de crédito ou débito, não é possível estipular limite de valor.

Quando o lojista é obrigado a efetuar trocas dos produtos? Qual o prazo para troca?

De acordo com o artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), o comerciante será obrigado a efetuar a troca dos produtos de consumo durável ou não durável quando estes apresentarem “vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas”.

Dispõe ainda o artigo que, se em 30 dias não for solucionado o defeito do produto pelo fornecedor ou lojista, pode o consumidor exigir a substituição imediata do produto por outro de mesma espécie e em perfeitas condições de uso ou exigir a devolução da quantia integral paga, corrigida monetariamente, sem prejuízo de eventuais perdas e danos que o consumidor possa ter experimentado.

Outro ponto que merece destaque são os bens que são considerados essenciais. Apesar de o código não discriminar quais bens são considerados essenciais, em seu parágrafo 3º, artigo 18, deixa claro que tratando-se de bem essencial, ou seja, aquele de uso indispensável, o fornecedor ou o lojista deverá efetuar a substituição imediata do produto, sem que o consumidor tenha que aguardar os 30 dias do disposto no caput do artigo.

Obviamente, a essencialidade do produto deve ser analisada caso a caso.

Qual prazo o consumidor tem para reclamar sobre o vício do produto?

Dispõe o artigo 26 do CDC que se o produto ou serviço apresentar vício (defeito) aparente ou de fácil constatação, o consumidor tem 30 dias para reclamar, fundamentada e comprovadamente junto ao fornecedor ou comerciante, dos produtos e serviços não duráveis, como: alimentos ou serviço de lavagem de roupa, e 90 dias para os duráveis, como: roupas, sapatos, e eletrodomésticos.

Esses prazos começam a contar da entrega efetiva do produto ou do término da execução do serviço. Contudo, em se tratando de vício oculto, aquele que o consumidor só percebe no momento do seu surgimento, esses prazos (de 30 e 90 dias) iniciam-se no instante em que ficar evidenciado o defeito.

Já na esfera judicial, de acordo com o artigo 27 do CDC, é de cinco anos o prazo para pedir indenização por danos de acidentes causados por produtos ou que fazem mal à saúde e à segurança do consumidor. Nestes casos, assim como a fábrica, o vendedor também é responsável solidário pelo produto. As alterações decorrentes de mau uso são de responsabilidade do consumidor.

Sou obrigado a efetuar troca de produtos em liquidação?

Preliminarmente, vale destacar que o lojista apenas é obrigado por lei a efetuar trocas de produtos que tenham defeito de fabricação. Em todos os outros casos, inclusive produtos adquiridos em liquidação, não é obrigatória a troca.

Se a questão for tamanho, cor, modelo ou outro motivo qualquer, a troca dependerá de o lojista assumir tal compromisso com o cliente no momento da compra. Deve-se ressaltar que esse compromisso deverá estar por escrito, caso contrário não terá validade.

Em caso de impossibilidade de trocas de peças em liquidação, o consumidor também deverá ser alertado, preferencialmente por escrito (na etiqueta, no caixa da loja e na vitrine) de maneira clara e ostensiva e com o prazo para troca.

Muitas empresas aceitam trocar produtos que não apresentam defeitos, mas agem assim por mera liberalidade, com o propósito de estabelecer um bom relacionamento com seus clientes, permitindo inclusive trocar um produto por outro. Tal prática transmite uma imagem positiva para o consumidor, estimulando sua fidelidade, e aumentando o faturamento empresarial, no entanto, não implica em qualquer obrigação ao lojista.

E se a compra for efetuada pela internet, o consumidor pode desistir da compra?

Sim. Neste caso, o artigo 49 do CDC disciplina sobre o direito de arrependimento do Consumidor. Isso significa que quando as compras forem realizadas fora do estabelecimento comercial (pela internet, catálogo, telefone, domicílio etc.), ou seja, quando não é dada a oportunidade prévia do consumidor de ter conhecimento sobre o produto que está adquirindo, esse poderá desistir da compra no prazo de sete dias, a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço.

Exercitado o direito de arrependimento, o consumidor deverá ser restituído dos valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, de imediato e monetariamente atualizado.

Não tenho mais a peça que apresentou vício/defeito para efetuar a troca do produto. O que devo fazer?

O lojista deverá fornecer a opção ao consumidor de efetuar a troca do produto por qualquer outro de mesmo valor existente na loja ou oferecer a devolução integral do valor pago pela mercadoria, atualizado monetariamente.

Como devem ser as informações sobre o preço das peças?

Os preços devem estar posicionados nas peças de forma correta (de fácil visualização pelo consumidor, de modo a não induzi-lo a erro), clara (o valor deve sempre ser expresso à vista caso haja opção pelo parcelamento) e, em língua portuguesa. No mesmo local deve haver a divulgação de suas condições, indicando número e valor das prestações, taxa de juros e demais acréscimos ou encargos, bem como o valor total a ser pago em caso de parcelamento.

Todas as informações sobre o preço devem vir indicadas da mesma forma (com fonte e tamanho de letras iguais), legível (com letras e caracteres que não possam ser apagados), precisa (que contenha a exata informação que o consumidor busca) e ostensiva (perceptível, sem a necessidade de qualquer esforço para a sua compreensão).

Vale destacar ainda situação muito corriqueira, ou seja, quando o lojista não possui a peça de exposição, para venda imediata: nesses casos, o lojista deve informar o cliente por escrito (de preferência na própria peça deve conter a informação), sobre a necessidade de solicitação de encomenda da peça para entrega posterior.

Por fim, o lojista deve sempre emitir nota fiscal e deixar um exemplar do Código de Defesa do Consumidor no caixa, em local visível ao consumidor. O não cumprimento destas normas pode ensejar a aplicação de multa pelo Procon e pela Secretaria da Fazenda.

*Érica de Lima Siqueira é advogada formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie em 2012. Atua em São Paulo e é advogada da equipe de Direito do Consumidor e Imobiliário no escritório Cerveira Advogados Associados (www.cerveiraadvogados.com.br).

Artigo publicado: Portal Segs, 4 de dezembro de 2014

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