Defeitos do imóvel alugado: alternativas do locatário

Os contratos de locação são bilaterais, ou seja, a cada contratante cabe o cumprimento de uma determinada obrigação, e uma das partes não pode exigir, da outra, o cumprimento da respectiva obrigação antes de cumprir a sua, nos termos do artigo 476 do Código Civil.

As obrigações do locatário são bem conhecidas, e incluem, principalmente, o dever de pagar o aluguel e os encargos locatícios, além de outras obrigações acessórias tais como o cuidado com a manutenção do imóvel e, eventualmente, a contratação de seguro e o pagamento de impostos. Tais obrigações geram o maior número de discussões judiciais com relação às locações, especialmente no que diz respeito à falta de pagamento dos aluguéis e encargos: afinal, não havendo o pagamento, o inquilino não pode exigir a contrapartida do locador, que é a utilização do imóvel.

Ocorre que o locador também tem determinadas obrigações, previstas no artigo 22 da Lei do Inquilinato e no Código Civil: dentre estas, a mais relevante é a entrega do imóvel em condições de servir ao uso a que se destina.

Caso o locador não entregue a posse do imóvel ao inquilino, ou o entregue sem condições de servir ao uso previsto em contrato (residencial ou comercial), não poderá exigir do inquilino que cumpra suas obrigações, especialmente o pagamento do aluguel.

Neste ponto, vale lembrar que aplicam-se à Lei do Inquilinato as disposições do Código Civil, no que a primeira lei for omissa.

E o Código Civil estabelece três possibilidades para a parte que firmou um contrato bilateral, quando o outro contratante não cumpre suas obrigações: revisar o contrato, com base no artigo 317 do Código, ou requerer a sua rescisão, com pedido de perdas e danos. Também poderá exigir a correta prestação que lhe é devida pelo outro contratante.

Em todo o caso, o locador não poderá exigir do inquilino o aluguel e demais encargos, enquanto perdurar a situação.

Os Tribunais, ao aplicar a regra da exceção do contrato não cumprido às locações, em geral tratam de casos nos quais o imóvel apresentava algum defeito desconhecido do locatário, e que este não assumiu quando da contratação, para conceder a indenização e isentar o inquilino dos aluguéis e encargos locatícios. Exemplos são situações em que o imóvel não se encontra regularizado e não permite a obtenção de alvará de funcionamento comercial (em se tratando de locações comerciais), vazamentos, defeitos estruturais que comprometem a segurança dos ocupantes etc..

Em tais ocasiões o inquilino, para além da indenização por danos materiais e (eventualmente) morais, tem o direito de ser isentado dos aluguéis e encargos locatícios, e de receber de volta os valores pagos a este título e a título de “luvas”.

O inquilino também pode pleitear medida judicial liminar para suspender a exigência dos valores locatícios, enquanto discute a responsabilidade do locador pela rescisão contratual, com base no artigo 273 do Código de Processo Civil. Uma medida desta natureza pode ser utilizada para impedir protestos e apontamentos junto aos órgãos de proteção ao crédito, além de suspender eventuais ações de execução referentes a aluguéis, encargos locatícios e multas rescisórias.

É importante, em tais ocasiões, que o locatário guarde o maior número de documentos possível acerca dos problemas sofridos, como fotografias, gravações e vídeos, comprovando os defeitos do imóvel, de modo a possibilitar a concessão da ordem judicial.

Em uma situação atípica, decisão recente prolatada por um juiz da 11ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo suspendeu a exigibilidade dos créditos locatícios de um shopping center recém-inaugurado, na Capital Paulista, em face do inquilino – lojista. O juiz entendeu que o atraso na inauguração do shopping, que resultou no atraso na entrega do espaço comercial ao lojista, comprometeu o cronograma de despesas e receitas do inquilino, o que autorizou a concessão da liminar.

Em todo o caso, o que importa é verificar se o problema compromete, de maneira efetiva, a utilização do imóvel, sendo importante procurar auxílio de um advogado e tomar um curso de ação o mais rápido possível. Os Tribunais por vezes interpretam o silêncio do inquilino como sinal de sua concordância com a situação, o que pode comprometer o resultado de um futuro processo judicial.

* Francisco dos Santos Dias Bloch é advogado formado pela PUC/SP, e atua em São Paulo, no escritório Cerveira Advogados Associados, nas áreas de Direito Imobiliário e Direito Contencioso Cível. Mais informações, acesse o site: www.cerveiraadvogados.com.br

Artigo publicado: Site Jornal O Retrato, 3 de novembro de 2014

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